terça-feira, 17 de outubro de 2017

PORTUGAL A ARDER ; verão de 2017


 PORTUGAL A ARDER : verão de 2017


                                                    I 
O que aconteceu nesta época em quase todo o país,
Portugal, muitos de nós viveram em décadas anteriores e por vezes sofrendo perdas indescritíveis.

Quase todos os anos, desde há décadas, acontece no verão este desvario em tão
antigo país, o dos Descobrimentos e o do Pinhal de D. Dinis,agora ardido em cerca de 80%. A rainha deixou cair as rosas. Enquanto isso, rezando pelos camponeses, as forças de ataque aos focos (os bombeiros, como sabemos) estavam quase continuamente mobilizados, cerca de cinco meses, apoiados por uma fatia do Exército e pelo desespero, sobretudo no «último dia» dos populares, aos gritos, com baldes, diversas mangueiras de jardim. Quando a meteorologia falhou a chuva, as chamas banquetearam-se com mais uns milhares de hectares, varrendo, nesses derradeiras horas, 238 e aumentando de 40 vítimas mortais as dezenas já desamadas por Deus . Uma comissão independente já entregara o seu relatório sobre a mítica Pedrógão e já os políticos mais desamparados mas excitados com as terminadas eleições autárquicas, ouviam o Primeiro Ministro, pausado, assegurar que aquele relatório ajudaria muito a arrancar com uma nova aventura de ordenação forestal, a par da reconstrução das casas ardidas,  recuperação de máquinas, reposição dos meos vivos e técnicos para uma agricultura bem emparcelada, vigiada e regularmente limpa dos lixos naturais.
Costa foi pragmático e sereno. Ora isto não era compatível com as vitórias autarquicas e a ira da activa Cristas, que pedia desculpas e anunciava uma moção de censura contra o governo da doce geringonça. Tudo isto faz parte da nossa turbulenta existência, mas o momento não era TODO político. Passava por muitas incúrias mas envolvia muitas crises existenciais, a necessidade das pessoas se darem as mãos e reinventarem, contra a dor, um melhor 25 de Abril. Portas e Cristas parecem ter corrido para o jardim das Oliveiras redigir o
golpe abrangente da moção, pensar nas câmaras, brincar aos reinos deles: acabar com a Ministra da Administração Interna, correr com os comandos dos bombeiros, forçar mr Trump a oferecer ao rosto da Europa maqinaria, janelas  de alumínio, alfaias, torres de vigia, planos de terras e árvores reordenadas, assim por diante. 
Chove. Os bombeiros descansam. Agora é fúria pública do ensaio geral: os políticos, sindicatos, gente da face-book ou correntes sociais, todos vão pensar nas cabeças a rolar, nos ministros de bom gosto, nas chamas de um país mais moderno e descongelador de salários, serviço público, enfermeiros, mamutes da banca e das grandes empresas. Pode até acontecer que António Costa tropece e que só os velhos desistam de emigrar.O CDS, que pouco modernizou a nossa agricultura, pensa em florir os campos e avançar com cooperativas, apoiadas por jovens bem pagos, os velhos sorrindo na soleira das portas. Um Portugal mais moderno e bem disposto. Os religiosos agradeceram a Deus não terem ardido os hospitais do SNS. Quanto às escolas, que não ardem mas se encharcam de infiltrações, com menin0s maus batendo nos mais fracos,essa é outra página  e mais justos julgamentos






Nada se podia alargar derepente: mil casas em cinco meses, um novo e moder- níssimo  sistema de comunicações, o uso das calhas para esse efeito, por exemplo, embora a notícia que isso já estava em andamento omita que tal processo precisa ainda de mito tempo e muito dinheiro. Além do mais, é preciso dignificar o enterro dos mortos e cuidar psicológica e materialmente dos vivos (Não estamos a falar do Processo Marquês).
Esperemos, pelo menos, pelo Conselho deMinistros do próximo sábado, no qual se val estudar o ajuizado relatório sobre Pedrógão, desenhado por uma comissão aberta e independente, documento que tem sido muito elogiado, sim senhor, mas que terá de contar com planeadores de várias disciplinas, das vias de comunicação, arquitectura consoante o uso e ligação, a famosa reordenação
da floresta.
Nada disto se resolve com algazarras no parlamento, com muitos meios tecnicistas nos partidos e personalidades qualificadas,como aquele senhor, Ribeiro Telles, que tanto nos ensinou e tanto esquecemos. Cuidado com as grandes cidades e a desarticulação florestal, cargas de eucaliptos e pinheiros bravos. Nada disso, a sufocar gente, repartições, escolas, tudo colado às planta-ções sem água, para os incendiários da romântica queimada descuidarem até ao fim das suas alfaias. 
Somamos aqui a ideia, já atirada para o ar, da criação de um bem dimensionado  Ministério  da Agricultura, reordenamento, formação e tecnolo- gias.











No último dia de incêndios que deflagraram por quase todo o país, como quase sempre acontece nos meses do Verão, o medo, o pânico, a luta entre- tanto acontecida no movimento das populações e chamas explosivas, de que não há memória, surpreendia também os próprios bombeiros , meio retidos pela orografia das zonas abismais, o fogo a subir e a travar quase todas as manobras tentadas em largas extensões de floresta ou lixo sem memória, mangas abrindo água ao máximo, corridas de pessoal civil com baldes, os gritos e as frequentes tentativas de evacuamento de populações em risco, muita gente correndo entre casas e carros,outros encolhidos nos interiores já a fumegar, tudo era enfim «resolvido» para uma fase de combate aos fogos, apesar da ventania e dos urros de duas coisas entretanto semelhantes: a passagem dos meios aéreos vertendo milhares de litros de água sobre as manchas de labaredas e os urros de idosos e novos para salvarem carros tombados e proteger os últimos velhos que a GNR conseguira transportar para lugares de acolhimento, mais tarde para dormirem e comerem, esperando que a manhã não lhes contasse só casas ardidas, gado queimado, bombeiros ainda diante das novas frentes de novos fogos, homens semi-desfeitos de exaustão, sempre a trabalhar, sempre à espera que pudessem descansar. Serviço dantesco e muito difícil de coordenar em áreas imensas, perante fogos contínuos de 30 metros de altura, fumo negro por cima, fechando em negro o céu, torrando os rostos erguidos, ensombrando as paredes de empenas com janelas abertas e destruídas, tochas das grandes guerras do século XX.

Um dia haverá organicamente mais  aldeias, outras
aldeias, habitadas não só por velhos e a enquadrar o
espaço de novas culturas, novos  engenhos e parques industrias, ligados aos géneros destas arrumadas sementeiras, ao património, aos meios de defesa e de produção, sem a necessidade de escarnecer de  ministros, como se os governos tivessem de voar por todos os sítios, sabendo de tudo
além de conseguirem entrelaçar  o dia e a noite, contando dinheiros todos em igualdade, seriedade, solidaiedade. Então indivisível, natural, a população
humana ilumina-se num espaço polis, céus limpos, os quadros alinhados, os excessos apagados, o futuro visto pelos testemunhos e semplesmente em morte. Hoje ainda é difícil perceber como as florestas dos Dembos,   em   Angola,  não  entravam   em    ignição                                                        mesmo flageladas longamente com napalm.

                                                      ROCHA DE SOUSA